Por Bruno Carvalho
Um senhor negro sentado na calçada. Olhos dispersos e um pedaço de madeira na mão. É o sinal. Haverá uma catástrofe por aqui. Disso eu tenho certeza. Eles aparecem por aqui como se não quisessem nada, mas na verdade vêm buscar muitos. Aquela senhora com feição austera sentada no banco também é um sinal. Eles não são desse mundo. Vou trabalhar triste, pois sei que será impossível salvar vidas hoje. Eles já sabem o que fazer. Percebo que hoje estou aqui apenas para cumprir rotina.
Muitas coisas estranhas aconteceram desde aquele dia. A começar por eu ter acordado bem cedo sem sentir qualquer sono. Era como se eu estivesse acordando para um dia no clube. Levantei-me e saí para a corrida matinal. Na frente da padaria havia um mendigo. Pensei comigo mesmo “- Que estranho um mendigo acordado a essa hora?”. Ele não me pediu nada, mas eu dei uns trocados a ele. Ao receber ele me disse: - Ela ainda gosta de você! Ainda atordoado pelo ar da manhã, não consegui entender o sentido daquilo. Mal sabia eu que o dia estava apenas começando.
Uma maçã, dois pães e um copo de suco – foi o que tomei no café da manhã. “Mais um dia de trabalho seu filho da puta” – pensava eu no carro, a caminho do trabalho, e ainda cansado pela corrida. Ao parar em frente ao hospital, vi um senhor negro, que vestia roupas modestas. Ele estava com um pedaço de madeira na mão. Parecia estar esperando algo, talvez notícias de algum parente.“Hoje não vai ser um dia normal”- Foi o que pensei mecanicamente. E eu estava certo. Naquele dia morreram mais de sessenta no hospital. Aquilo nunca havia acontecido. E desde então, percebi que aquele senhor poderia ter algo a ver com isso.
É difícil descrever como os identifico, pois eu simplesmente sinto. "Eles" são muito espertos, pois sabem se disfarçar. Um trabalhador de rua, um vendedor, uma pessoa simples, um mendigo, enfim, “pessoas que na maioria das vezes são ignoradas”.
"Eles" sabem que eu sei. No entanto continuam normais. Eu não posso fazer nada, nem quero. Gosto de saber das coisas por saber, sem contar a ninguém. Enquanto todos se perguntam “O que está acontecendo com o Mundo!”, eu apenas concordo, já sabendo de tudo. Esse é o meu jeito, vai ver é por isso que me escolheram.
Olho para o senhor e o cumprimento. Todos me olham com doçura, pois acham que estou cumprimentando um homem simples. Mal sabem que diante da verdadeira pessoa daquele homem mal vestido, sou, na verdade um cisco, um merda, um grão de areia. “As aparências enganam” – É, deve ser verdade.
Por que a tristeza doutor? – é o que me perguntam de minuto a minuto. Mal sabem que algo terrível estará para acontecer. O tempo passa e a rotina continua a mesma. Queria estar enganado em relação aos meus sentimentos, mas não consigo. Pois esse sentimento é algo que não se pode enganar.
Um breve intervalo para o lanche. Depois de comer algo, encho meio copo de café como sempre faço, e começo a observar a rotina lá fora. Surpreendo-me ao perceber que agora não são dois e sim seis. Um a cada cinqüenta metros. Meu Deus, tudo está tão claro! Com pode ninguém perceber isso!
Vinte minutos depois, recebo a notícia de que o hospital irá explodir. “Ainda tenho esse café para beber...” – penso eu. Não quero sair dali. Sento-me, e enquanto tomo vagarosamente o café, observo como tudo acontece, como eles agem... Deus! Eles realmente sabem o que fazem!
O prédio inteiro se explode. Que coisa estranha todos morrerem com exceção de mim. O único a estar no corredor B do hospital. O único setor não atingido pelas chamas. Que estranha a sensação de que aquele era apenas mais um dia de trabalho. Centenas de pessoas, todas elas mortas. Ninguém sabia o que havia acontecido. Os repórteres me perguntam: - O que aconteceu? E eu respondo – Havia seis deles por aqui, já estava previsto. E os pobres repórteres se entreolham dizendo: - Coitado... está em estado de choque!.
Chego em casa mais cedo. Minha esposa me pergunta o que aconteceu. Com toda razão, pois eu estava muito mais sujo de sangue que o normal. Explico a ela. Tento interpretar minha tristeza. Não gosto de mentir, mas eu a amo, e de maneira nenhuma quero assustá-la com a verdade. Ela acredita e fica pasma. Liga para a mãe. A mãe já sabe, pois a notícia já se espalhou pelo mundo.
Minha mulher me deixa sozinho. Ela sabe que nesses momentos eu gosto de ficar só. Penso que terei que mudar de cidade. Volto a pensar naquele dia. Aquele dia em que percebi que tinha esse poder. Sim meus amigos, o mendigo era um "Deles". E realmente ela ainda me amava. Tanto que meses depois nos casamos.
Um senhor negro sentado na calçada. Olhos dispersos e um pedaço de madeira na mão. É o sinal. Haverá uma catástrofe por aqui. Disso eu tenho certeza. Eles aparecem por aqui como se não quisessem nada, mas na verdade vêm buscar muitos. Aquela senhora com feição austera sentada no banco também é um sinal. Eles não são desse mundo. Vou trabalhar triste, pois sei que será impossível salvar vidas hoje. Eles já sabem o que fazer. Percebo que hoje estou aqui apenas para cumprir rotina.
Muitas coisas estranhas aconteceram desde aquele dia. A começar por eu ter acordado bem cedo sem sentir qualquer sono. Era como se eu estivesse acordando para um dia no clube. Levantei-me e saí para a corrida matinal. Na frente da padaria havia um mendigo. Pensei comigo mesmo “- Que estranho um mendigo acordado a essa hora?”. Ele não me pediu nada, mas eu dei uns trocados a ele. Ao receber ele me disse: - Ela ainda gosta de você! Ainda atordoado pelo ar da manhã, não consegui entender o sentido daquilo. Mal sabia eu que o dia estava apenas começando.
Uma maçã, dois pães e um copo de suco – foi o que tomei no café da manhã. “Mais um dia de trabalho seu filho da puta” – pensava eu no carro, a caminho do trabalho, e ainda cansado pela corrida. Ao parar em frente ao hospital, vi um senhor negro, que vestia roupas modestas. Ele estava com um pedaço de madeira na mão. Parecia estar esperando algo, talvez notícias de algum parente.“Hoje não vai ser um dia normal”- Foi o que pensei mecanicamente. E eu estava certo. Naquele dia morreram mais de sessenta no hospital. Aquilo nunca havia acontecido. E desde então, percebi que aquele senhor poderia ter algo a ver com isso.
É difícil descrever como os identifico, pois eu simplesmente sinto. "Eles" são muito espertos, pois sabem se disfarçar. Um trabalhador de rua, um vendedor, uma pessoa simples, um mendigo, enfim, “pessoas que na maioria das vezes são ignoradas”.
"Eles" sabem que eu sei. No entanto continuam normais. Eu não posso fazer nada, nem quero. Gosto de saber das coisas por saber, sem contar a ninguém. Enquanto todos se perguntam “O que está acontecendo com o Mundo!”, eu apenas concordo, já sabendo de tudo. Esse é o meu jeito, vai ver é por isso que me escolheram.
Olho para o senhor e o cumprimento. Todos me olham com doçura, pois acham que estou cumprimentando um homem simples. Mal sabem que diante da verdadeira pessoa daquele homem mal vestido, sou, na verdade um cisco, um merda, um grão de areia. “As aparências enganam” – É, deve ser verdade.
Por que a tristeza doutor? – é o que me perguntam de minuto a minuto. Mal sabem que algo terrível estará para acontecer. O tempo passa e a rotina continua a mesma. Queria estar enganado em relação aos meus sentimentos, mas não consigo. Pois esse sentimento é algo que não se pode enganar.
Um breve intervalo para o lanche. Depois de comer algo, encho meio copo de café como sempre faço, e começo a observar a rotina lá fora. Surpreendo-me ao perceber que agora não são dois e sim seis. Um a cada cinqüenta metros. Meu Deus, tudo está tão claro! Com pode ninguém perceber isso!
Vinte minutos depois, recebo a notícia de que o hospital irá explodir. “Ainda tenho esse café para beber...” – penso eu. Não quero sair dali. Sento-me, e enquanto tomo vagarosamente o café, observo como tudo acontece, como eles agem... Deus! Eles realmente sabem o que fazem!
O prédio inteiro se explode. Que coisa estranha todos morrerem com exceção de mim. O único a estar no corredor B do hospital. O único setor não atingido pelas chamas. Que estranha a sensação de que aquele era apenas mais um dia de trabalho. Centenas de pessoas, todas elas mortas. Ninguém sabia o que havia acontecido. Os repórteres me perguntam: - O que aconteceu? E eu respondo – Havia seis deles por aqui, já estava previsto. E os pobres repórteres se entreolham dizendo: - Coitado... está em estado de choque!.
Chego em casa mais cedo. Minha esposa me pergunta o que aconteceu. Com toda razão, pois eu estava muito mais sujo de sangue que o normal. Explico a ela. Tento interpretar minha tristeza. Não gosto de mentir, mas eu a amo, e de maneira nenhuma quero assustá-la com a verdade. Ela acredita e fica pasma. Liga para a mãe. A mãe já sabe, pois a notícia já se espalhou pelo mundo.
Minha mulher me deixa sozinho. Ela sabe que nesses momentos eu gosto de ficar só. Penso que terei que mudar de cidade. Volto a pensar naquele dia. Aquele dia em que percebi que tinha esse poder. Sim meus amigos, o mendigo era um "Deles". E realmente ela ainda me amava. Tanto que meses depois nos casamos.
Já não há mais vagas para médicos por aqui. Com a explosão foram-se amigos, parentes, pacientes com quem eu adorava de conversar... Uma pequena risada escapa de meus lábios. Eu não me importo. Com toda certeza eu não me importo. Estaria eu me tornando um “Deles”?.
5 comentários:
Brunão, no começo desse texto, pensei: "esse cara está assistindo 'Lost' demais!", hahahahahaha!! Mas depois vi que a coisa é muito, mas muito melhor do que eu pensava. Aliás, vai se fUder, né? Vc virou pra mim na terça-feira de madrugada, dizendo que ainda não tinha nada pronto, e me aparece com uma pérola dessas, feita no mesmo dia! Com certeza, vc não é desse mundo MESMO! Vc é realmente um DELES!!!!!
Grande abraço! E eu quero essa no próximo livro!
Concordo com o Ciro! Esse tema e esse estilo são os meus preferidos, o jeito que eu gostaria de escrever...
E daria um ótimo filme, também! Já antevejo o trailer: "Eles estão por toda parte... Cuidado pra não se tornar um deles!" rsrsrsrs
Parabéns, Brunão! A cada terça, uma surpresa melhor! Bjos!!!
Bruno
Espero que continue neste repente: "Escrever bem".
Como disse, você merece muitos créditos pelos textos que escreve. Alguns, leio. Outros passam batidos, entre os escritores desta pagina, todos merecem minhas considerações, mas você em especial.
Parabéns.
Caramba, esse texto me deu medo! Hehehehe
Bruno, Bruno! É ululante o seu crescimento nesse blog! Parabéns mesmo! Esse sem dúvidas vai para o meu top 10 de Bruno Carvalho ao lado de:
* Não vale a pena latir por mim, cachorrinho... (The best!)
* O outro lado da moeda... (sobre o Jonas)
* Filosofia de um bêbado... (Em que você dizia: Sou o senhor absoluto de tudo que faço e penso, e para isso só precisei de tomar seis latinhas de cerveja)
* Declaração universal dos tímidos... (Lavou a alma da galera!)
* A bandinha de garagem da menina Hanky Panky (Putz! Incrível!)
E que venham mais sucessos!!
Grande abraço!
Caríssimo...
É um excelenticíssimo texto...
Como a Céci disse: falta-nos uma produtora pra produzir o filme. Muito bom msm.
Aliás, perfeito como sempre! Abrç!!!
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