Por Bruno Carvalho (Lá vamos nós com outra ridícula...)
Pareço estar em uma espécie de tribo. Todos aqui falam uma língua completamente desconhecida por mim. Estou com a minha pequena mala de andarilho. O básico do básico: barraca para uma pessoa, roupas de frio, sabonete, escova de dente, comida e um barbeador descartável. Como eu vim parar por aqui eu ainda não sei. Sequer sei porque me aventuro a andar sozinho por essas estradas e entrar em caminhos estranhos. É só a vida me dar uma rasteira para eu pegar minha mala e seguir a pé pela estrada. “Brigamos nas cidades, fazemos as pazes na estrada” Essa é minha relação com a vida. Se sair vivo daqui, mandarei fazer uma placa de madeira com essa citação...
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O garoto estranhou ao me ver fazendo a barba. Com razão, pois barbeadores descartáveis nunca foram vistos por aqui. Aliás, tudo por aqui é bastante rústico: as casas, as poucas vestes que eles usam, a linguagem, etc.
Foi engraçado ver o garotinho prestar atenção. Ele sorriu e balbuciou algo. Apontou para a minha face demonstrando muita curiosidade. Senti-me um grande mágico, que faz um belo truque, do qual todos ficam imaginando: Como será que ele faz isso? Desde então, o garoto ficou meu amigo...
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Já me sentia como um membro da família. Tanto que passei a trabalhar carregando coisas de um lado para o outro. Digo coisas, porque sequer consegui descrever objetos tão estranhos.
- Podem me chamar de “chapa” - Dizia eu, descontraídamente para meus novos amigos. Estranhamente nos entendíamos. Eu, na boa e velha Língua Portuguesa, e eles, em sua linguagem local. Outro fato que me chamou a atenção, foi o modo como trabalhávamos: Ninguém conversava com ninguém. Eu carregava as coisas simplesmente por perceber que eles precisavam de um carregador. Cada um na sua função, nada mais do que isso. Ninguém me obrigou a estar lá, e por se tratar de um benefício comum, todos trabalhavam.
Os dias se passaram rápido. Tanto que quando dei por mim já estava por lá por quase um ano. Nunca me senti tão bem. A rotina, que antes era minha inimiga, passou a ser minha melhor companheira. Passei a notar a importância de um objetivo na vida, nem que esse seja um objetivo bastante simples: “trabalhar e descansar”. Meu corpo já não era o mesmo. Sentia-me forte e preparado para tudo. Acordava cedo todos os dias e sem pestanejar. Não precisava mais pensar em teorias do mundo, ou simplesmente reclamar por não ter um trocado para tomar uma cerveja. Já não precisava mais disso. Não tinha a ambição que todos temos no caos que é o mundo da civilização...
Mas estranhamente, e vagarosamente passei a pensar em como estaria o mundo naquele momento: Que filme estaria passando no cinema? Qual programa de TV ou artista estaria em voga? Que música estaria fazendo sucesso? Qual seria o padrão de beleza? Será que aumentaram o preço da Pizza? Será que inventaram um estilo de música pior que o funk? E milhares de outras futilidades que tanto condenamos...
O garotinho olhou para mim. Era como se dissesse:
- Vai, pois você pertence ao Mundo!
E eu fui. Antes, claro, me despedi de todos. Ninguém me entendia. Todos perguntavam: - Por que partir agora? Você não está se sentindo bem aqui? E eu respondia: Nunca me senti melhor em toda minha vida, e é justamente esse o problema...
Novamente peguei a estrada. Porém, satisfeito com a vida e ciente de meu destino. Não havia objetivos, barreiras, fronteiras e especulações. Apenas a sensação de um novo desafio que estaria por vir. Pessoas como eu não possuem lugares no mundo. Pessoas como eu não possuem vocação, e se possuíssem abririam mão. O mais importante é o que se encontra no caminho, e não no topo do mundo.
E cá estou eu de volta ao mundo capitalista. Olho intensamente a placa de madeira que eu mesmo escrevi:
"Brigamos na cidade, fazemos as pazes na estrada”
Talvez esse seja o meu maior problema: Gostar de viver com tudo e com todos. Experimentar cada particularidade, cada momento, cada adversidade. Prazeres diferentes e tudo mais. Até arrumar um outro motivo para partir para a estrada novamente...
8 comentários:
ÊÊÊÊ!!! Primeiríssimo a comentar!!
Não sei por que, mas senti certa identificação com o seu texto! hehehe Não que eu esteja vivendo entre nativos tribais, mas talvez nem seja tão diferente!
Olha, Bruno, achei mto interessante essa coisa de "se encontrar" na "estrada"! Assim como Elvira (a rainha das Trevas), nós já carregamos todo o poder conosco (o anel é só uma simbologia). Portanto, acredito q a "estrada" ou a outra morada qualquer tb sejam apenas propiciadores do desenvolvimento ou utilização desse "poder". hahahahahahahaha Viajei, hein? Em outras palavras, primo, seu texto me mostrou que a gente busca, busca, mas sabe que a questão não é bem "onde", mas sim "como"!
Parabéns pela inovação no estilo!! Isso tem se tornado uma constante por aqui, hã? hehehe Show de bola, rapaz!
Grande abraço!!
Brunão, Brunão... adorei isso. Ficou meio que um "robinson crusoé" do século XXI. Só que de um modo diferente, mais resumido, mais gostoso de se ler... mais moderno. Muito bom mesmo.
Acho que o Felipe disse tudo já! Concordo com ele, tirando a parte da "Elvira rainha das trevas" (o cara gostou mesmo desse filme, vou mandar fazer uma 'ebrazeba' pra ele), hahahahahahahhahahaha!!!
Brunão, é vc que não me surpreende mais, cara! Se tornou um escritor completo em pouquíssimo tempo. Já escreveu humor, crônica cotidiana, suspense, drama, diário... até história em quadrinhos! Agora só falta escrever uma poesia, e fica tudo certo! Vc é um dos melhores, cara! O que me faz pensar que a Cecília tem razão: esses seus comentários entre parênteses no início do texto são carência pura, cara!!! Hahahahahhahahahahahah!!!
E "ratinhos japoneses" é seu...
Grande abraço!!!
Muito bom,
um texto bem leve e interessantíssimo,
parabens irmo!!!
'Voga' é aquela revista americana?
Né ridiquim não, bem...
Boa, bruno. BOa! hahahahahaha
Nem vou screver, pois Ciro e Felipe disseram tudo!
Abç
uga, uga, uga, uga!!!!!!!!
Bom, faço minhas as palavras do Felipe e do Ciro.
E ainda reitero: esses comentários que vc faz no começo do texto são coisa de carentão que se finge de modesto só pra ganhar ainda mais elogios (rsrsrs).
De fato, você é bem versátil, tanto no estilo quanto nos gêneros em que escreve. Se não fosse tão clichê dizer isso, eu afirmaria: Bruno: 1001 utilidades. (Essa foi "pôdi", rsrsrs.)
Bjão!!!
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