Buzú Adventures

Passagem paga por Ciro M. Costa

Pra variar, o coletivo tava lotado. Era comum naquele horário. Mas, por mais comum que seja, parece que tem dia que não se está acostumado. Ainda mais naquele.

Eu estava sentado do lado de meu amigo, Diguito. Diguito era crítico pra cacete, e eu não sabia como ele ainda não havia tirado sarro daquele cheiro de ‘cecê’ cabuloso que estávamos sentindo. E não era só isso: tinha um sujeito atrás de mim que não parava de assobiar aquela musiquinha infernal do Super Mario Bros. Aquilo não parava. Tem gente que quanto mais sabe que está irritando, mais quer irritar. Onde há prazer nisso?

De repente, o ônibus parou. Ouvi alguém dizer:

- Olha lá! Que acidente feio, bicho!

O acidente era feio mesmo, mas nem precisava do ônibus ter parado. O motorista que era curioso mesmo. Nisso, a maioria dos passageiros foi lá pra frente pra ver a cena.

- Alá! – falou Diguito. – Alá o zé povinho! Foram tudo lá pra assistir! Zé povinho adoooora uma tragédia! Gosta de assistir tudo, só pra não ficar sem assunto na rodinha de amigos depois. Alá! Espia só!

E o cara de trás não parava de assobiar aquela música. Tem gente que é viciada mesmo em vídeo-games...

- Alá! – falou Diguito de novo. – O cara ta arrebentado mesmo, bicho. Quase morrendo. Pior que zé povinho fica tudo olhando, sem fazer nada. Aposto que tem médico ali no meio que tá com medo de pôr a mão na massa.

- Que isso, Diguito. – falei. – Ninguém é tão desumano assim não, cara.

- Rá! Cê bobo, filhão! Cê é muito ingênuo. Zé povinho é preguiçoso que dói. Dou minha cara a tapa se não tem gente ali enrolando pra chegar tarde no serviço.

E o cara de trás continuava assobiando aquela musiquinha infernal...

- Alá! Alá, ó! – falou Diguito de novo. – Agora que Zé Povinho resolveu chamar a ambulância, bicho! Que povo mais a toa! Neguim ali já tá quase indo pro saco!

- Fala assim não, Diguito. E a gente que nem fez nada até agora?

- É porque a gente não tem nada com isso, ué!? Esse motorista que tá enrolando! Daqui a pouco dá a hora dele ir pra casa! Ê Zé Povinho! Tá dooooido!

- É mesmo, hein? Será que o motorista é tão cara-de-pau assim?

- Vamos lá passar óleo de peroba na cara dele pra ver se ele não gosta! Hahahahah!!

O assobio continuava...

- Meu! Que isso? Zé povinho tá tirando foto! Vai tudo colocar no orkut!

- Será?

- Rá! Aposto! Isso se não tiver filmando pra botar no youtube! Zé povinho é tudo pobre de espírito.

- Diguito, você é mesmo...

De repente, olhei para trás. O cara da musiquinha do Mario Bros havia desaparecido, sem mais nem menos.

- Diguito, cadê aquele cara do assobio?

- Da musiquinha do Mário? Alá! Tá lá fora! Foi lá ver, junto com zé povinho! Bicho a toa. Zé povinho é igual Shakespeare: adoooora uma tragédia.

Diguito tinha razão, mas nem tanto. O cara do assobio também estava segurando uma caixa com um ponto de interrogação. Ele se aproximou da vítima (ainda assobiando aquela musiquinha alegremente) e a entregou. Depois disso, foi-se embora.

A vítima, por sua vez, abriu a caixa, e saiu andando, como se nada estivesse acontecendo. Diguito gritou:

- ALÁ!!! A VÍTIMA ERA SACANA!!! TAVA ALI FINGINDO DE MACHUCADA SÓ PRA NÃO IR TRABALHAR! AGORA FOI EMBORA DE BOA!!!! ÊÊÊÊ ZÉ POVINHO!!! ZÉ POVINHO É TUDO FILHO DA ...

Mas o buraco era bem mais embaixo. Um cara entrega uma caixa pra uma vítima e ela sai andando saudavelmente? Havia algo muito errado!

- Onde você vai??? – Diguito me perguntou.

Levantei-me e saí do ônibus. Diguito tinha razão: Zé Povinho era tudo curioso. Eu fazia parte dessa ‘massa’, fazer o quê? A gente critica, mas no final das contas, faz pior. E que ser humano não tem curiosidade? E você ficaria também, se visse aquela cena.

Peguei a caixa com a interrogação e não vi nada. Perguntei a um dos curiosos que ali estava se havia visto o que tinha saído da caixa, e ele me respondeu algo que não acreditei.

- E aí? – perguntou Diguito, que também não havia agüentado de curiosidade e já estava do lado de fora. – O que conseguiu descobrir? O que o bacana disse que tinha dentro dessa caixa aí?

- Um cogumelo verde.