Sentia o pesado e doloroso toque de suas mãos. Não sabia que amar doía tanto.
Sentia o molhado e indescritivelmente ruim gosto do beijo. Não sabia que amar era tão nojento.
Sentia o calor de um suado corpo sobre si. Não sabia que amar podia ser um fardo tão pesado.
Sentia o hálito e a acidez de sua boca em suas partes mais íntimas. Não sabia que o amor era tão grotesco... E era...
Por não saber várias coisas sobre o amor, vivia como se houvesse amado, ou estivesse em estado amorífico: vestia cuidadosa e domingamente, perfumava-se embriagantemente e corria para a janela, e esperava calma e resplendorosamente pela sua passagem. Quando ele passava, acenava-lhe sorrateiramente e implorava insistentemente por um sorriso que fosse, mesmo brevemente. Se este acontecia, brilhava ordinariamente e pensava, absurdamente, que houvera ganhado o dia. E não era só... Em sua alma, docemente, repousavam idealizações profundamente equivocadas. Isso pra ela era o amor...
Os sorrisos eram diariamente percebidos em suas faces, enquanto os prantos raramente eram observados. Para ela, indistintamente, havia sempre felicidade, pois julgava que aquele que amasse verdadeiramente não sofria. Ela estava enganada completamente, já que descobrira, um dia, furtivamente, uma dor que não sabia verdadeiramente de onde vinha. Essa dor, subitamente tomou conta de si... Tão fortemente que os sorrisos se trasmutaram em lágrimas e caíam vertiginosamente, como se fosse uma fonte da qual, infinitamente, escoava um líquido púrpura. Tudo por causa do amado, que, irresponsavelmente, tomou-lhe metade do coração e partiu. Ficou-lhe saudade e solidão, envoltos em amor... Ela descobriu, então, tardiamente, que amor nem sempre era sinônimo de alegria.
Muito se passou desde o roubo de metade do seu coração; mas num belo dia, desavisadamente, fez se sentir um olhar que a observava. Repentinamente, sua face se iluminou e percebeu intuitivamente que se tratava de um novo amor. Amor é único, dizia para si. Como amar mais de uma vez? Sem haver uma resposta que coerentemente lhe respondesse ao coração, fez se uma nova amante. Longe, distante, sem nunca haver ficado menos de dois metros do recém-conquistado.
Um dia, corajosamente, ousou deixar-se amar... Alguém trouxera-lhe a metade que faltava. E sentiu...
Sentia o leve e sensível toque de suas mãos. Acabara de descobrir que amar não machuca.
Sentia o molhado e indescritivelmente gosto do beijo. Gosto bom de amor. Descobrira que amar era algo secreto... Secretamente bom.
Sentia o calor de um suado corpo sobre si. Descobrira que amar era também se entregar de corpo, alma e prazer.
Sentia o hálito e o frescor de sua boca em suas partes mais íntimas. Descobrira, enfim, mais uma arte do amor... Descobriu finalmente que amor não era infinito...
... E era...
7 comentários:
Opa!!!
1º
Muito bem descrito Vassago,
sentimentos que caracterizamos como amor, mas que não se comportam verdadeiramente como tal,
até que o tal verdadeiramente aparece,
abraços,
Gostei do jogo de palavras, Regis. Não faz muito meu estilo esses textos sobre amor, mas confesso que desse eu gostei. Parece q vc tá apaixonado, hein? Hehehehehe!!
"Estado amorífico" pra mim foi a melhor! Fico pensando quando estarei nesse belo estado. Mas isso já é outra história. Por enquanto, fico no estado de Minas Gerais mesmo!
Grande abraço!
Amar.. palavra bonita, mas às vezes pode se parcer com um fardo. Achamos que amamos! Achamos... Isso só deixa de ser um fardo quando amamos realmente!
Excelente text Régis, muito bem escrito!
Parabéns!
Ótimo, isso tudo rapsodia que a 2ª vez sempre é a melhor.
Rê, certamente seu melhor texto como "Não-Vassago"...
Com imagens verdadeiramente interessantes e construções fortemente intrigantes, traz uma reflexão profundamente incômoda e, ao mesmo tempo, absurdamente reconfortante, visto que, maravilhosamente, retrata as várias perspectivas desse estranho mal que é o amor e desse incrivelmente saudável enfermo que é o amante...
Simplesmente A-DO-REI!!!
Parabéns!!!
Mil bjos!!!
Rê, certamente seu melhor texto como "Não-Vassago"...
Com imagens verdadeiramente interessantes e construções fortemente intrigantes, traz uma reflexão profundamente incômoda e, ao mesmo tempo, absurdamente reconfortante, visto que, maravilhosamente, retrata as várias perspectivas desse estranho mal que é o amor e desse incrivelmente saudável enfermo que é o amante...
Simplesmente A-DO-REI!!!
Parabéns!!!
Mil bjos!!!
Amar "adverbialmente"! Amar com sobrecarga de sentimentos e percepções...
Trouxeste uma interessante perspectiva do amor!
Ricamente belo!
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